Natural de Ribeirão Vermelho – MG
UNIDADE:
II/11º Regimento de Infantaria
POSTO OU GRADUAÇÃO:
Cabo. Ao regressar ao Brasil foi licenciado e reintegrou-se a suas atividades civis
CONDECORAÇÕES:
Medalha de Campanha
Entrevistado por um membro da Diretoria da Anvfeb/JF.
UM ACONTECIMENTO QUE FICOU GRAVADO EM SUA MEMÓRIA.
“Tudo
e todos os acontecimentos ocorridos durante o desenrolar da Campanha da
FEB na Itália, foi importante para mim. Assim sendo, vou começar,
contando como e porque fui incluído na Força que deveria representar o
Brasil na 2ª Guerra Mundial.
Em 1941, apresentei-me como voluntário
no 11º Regimento de Infantaria em São João Del-Rei. Tinha 16 anos.
Completei 17, no dia 7 de maio de 1941, já como soldado.
Para usar de franqueza, devo dizer que a
minha intenção era servir um ano para cumprir minha obrigação militar.
Mas todos sabem que a partir de 1941, até o final da guerra não houve
licenciamentos no Exército, razão porque, quando o meu Regimento, o 11º
RI, foi escolhido para integrar a FEB, tornei-me um expedicionário.
Embora pertencesse ao 11º Regimento de
Infantaria, segui para a Europa com o 6º Regimento de Infantaria, no dia
2 de julho de 1944 e, na Itália, quando a tropa que constituiu o
primeiro escalão entrou em ação de combate, o pessoal pertencente ao 11º
RI, que havia seguido com o 6º RI, passou a constituir tropa de reserva
para o recompletamento dos quadros.
Com a chegada dos 2º e 3º Escalões da FEB, que foram estacionados em San Rossore, próximo
a cidade de Pisa, fui procurar o meu antigo comandante de sub-unidade
(C.P.P./2) e pedir para ser requisitado. O Comandante da E.P.P./2 não
atendeu ao meu pedido como também me incluiu no meu antigo Pelotão de
Morteiros, porém não encontrei meus antigos companheiros, mas, mesmo
assim, fui recebido com cordialidade por todos e nos tornamos “uma
família unida”.
Depois de um período de instrução no
acampamento de San Rossore, seguimos para Silas, onde estava a Linha de
Frente. Passamos por um lugarejo chamado TORRE DE GRANAGLIONE, onde
fomos forçados a estacionar devido ao mau tempo (chuva muito forte),
para passar a noite. O inverno estava começando, porém ainda não estava
nevando. As noites, porém, eram muito frias e o solo e as plantas
amanheciam com uma camada de neve.
Para passarmos a noite naquela região, o
Comandante procurou abrigar todo o pessoal nas casas ali existentes, o
que não foi muito difícil porque as famílias italianas já estavam
acostumadas com aqueles contratempos. O meu Pelotão foi alojado na
Capela ali existente, um lugar muito apertado para tanta gente; mesmo
assim procuramos “nos ajeitar” da melhor maneira possível.
Depois de deixar “nossas coisas” no
local que me coube, sai para um reconhecimento dos arredores. Parado na
única pracinha do local, conversava com um colega, quando ouvi (eu já
entendia mais ou menos o italiano) um habitante da localidade comentar
que na casa dele havia lugar para umas 5 pessoas, mas que ninguém o
procurou. Dirigi-me, então, àquele que havia comentado e pedi-lhe que
não falasse sobre o assunto com mais ninguém, pois eu ia pedir ao meu
comandante autorização para aceitar o seu acolhimento.
Procurei o meu Comandante e, depois de
contar-lhe o fato, pedi-lhe permissão para aceitar o oferecimento do
italiano, o que me foi concedido. Procurei, então o cabo da outra peça
de morteiro, convidamos os dois sargentos do pelotão e também o sargento
auxiliar, e nos trnsportamos para a casa do hospitaleiro italiano, que
era um idoso.
Estávamos com as nossas roupas molhadas,
inclusive as roupas que se encontravam nos sacos. A temperatura havia
caído muito, razão porque, ao entrarmos na casa do italiano, procuramos
nos chegar a lareira a fim de nos aquecermos.
Habitavam aquela casa um casal de velhos
que eram chamados de “nonos”, por uma mulher cujo marido “tedeschi
portare-via”, um “bambino” de 9 anos mais ou menos e uma “ragazza” de 11
ou 12 anos, doente e acamada.
Pelo aspecto da casa e pela educação de
seus habitantes via-se que eram pessoas de classe média e que viviam com
relativo conforto.
Para nos confraternizar com aquela
delicada e hospitaleira família, procuramos estabelecer um “papo” o que
não foi difícil, apesar de ainda não estarmos bem familiarizados com o
idioma italiano, porque havia da parte dos italianos um desejo de
conhecer algo sobre o Brasil, sendo estabelecido uma espécie de serão
com o aparecimento de outras pessoas. Primeiro foi uma “ragazza” que
morava nas proximidades; depois foram alguns rapazes e mais uma ou duas
“ragazzas”. Falamos sobre vários assuntos e, de quando em vez, alguém
nos perguntava como era São Paulo, etc…
O primeiro que sentiu vontade de se recolher, foi o Sargento Thadeu – era o Sargento Auxiliar do Pelotão.
- Vou deitar-me – disse. Estou cansado…
- Espera um momento – disse a velha senhora que já havia se solidarizado conosco. Vou esquentar a cama.
- Não é preciso – disse o Sargento Thadeu um tanto encabulado. Não precisa se incomodar. Muito obrigado.
Com as nossas caras de “lobo mau”,
maliciamos o caso e isto encabulou ainda mais o Sargento que saiu da
sala, dirigindo-se para o quarto que lhe havia sido destinado.
Não demorou muito, esfregando as mãos e encolhido, retornou o Sargento Thadeu:
- Êta frio danado! A cama está tão fria que até parece que jogaram água gelada no colchão.
- Eu sabia que o senhor não conseguiria dormir – disse a senhora que a seguir saiu da sala.
Com aquelas mesmas caras de “lobo mau”, perguntamos a nós mesmos: será que ela vai deitar na cama para aquecê-la?
O que aconteceu foi o seguinte. Saindo
da sala a boa “nona” foi buscar uma vasilha de barro com alça, cheia de
brasas. Colocou uma armação de bambu ou taquara sobre a cama, pendurou a
vasilha de barro com alça que ficamos sabendo chamar-se “escaldine” e a
seguir cobriu a armação com os cobertores.
Dormimos naquela noite como uns justos
e, no dia seguinte, quando despertamos, encontramos as nossas roupas
enxutas, inclusive as roupas dos sacos de campanha, as nossas galochas
limpas e os nossos capotes escovados. Aquela boa “nona” e aquela
senhora, ainda bonita que tinha uma filha doente, cujo marido “tedeschi
potare via”, passaram parte da noite cuidando da roupa de cinco soldados
desconhecidos, fazendo aquilo que somente uma mãe faria e o que poucas
esposas seriam capazes de fazer. Ficamos comovidos. Não havia palavras
capazes de expressar nossos agradecimentos.
Quando fomos pegar a nossa primeira
refeição do dia, lembramos da menina doente e procuramos obter uma boa
ração de mingau de aveia para ela e outras coisas para atender também as
demais pessoas. Procuramos em nossos sacos aquilo que não nos fazia
falta e lá deixamos chocolate, biscoitos. Cigarros e até um par de
calçado e alguns agasalhos que não nos faziam falta, mas que,
absolutamente, não quitava a nossa gratidão.
Não me foi possível voltar a Granaglioni
e não tive mais notícias daquela gente boa que, numa noite de chuva,
frio e lama, nos acolheu em sua casa e nos deu demonstração inesquecível
de comovente solidariedade humana e de amor ao próximo. Fiz o possível
para voltar àquela localidade e rever os “NONOS DE GRANAGLIONI”, não
somente para abraçar-lhes como também para saber seus nomes. Não foi
possível. Um soldado, principalmente durante a campanha, não manda em
si.
Na guerra há dessas coisas…”
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“Um
outro acontecimento, que merece ser contado, aconteceu em BOMBIANA, bem
próximo de Castelo, durante a fase defensiva devido ao inverno
rigoroso.
A nossa Seção de Morteiros ocupou
posições em Bombiana e a guarnição ocupou uma casa de camponês italiano
que ali existia. A casa tinha dois pavimentos. O térreo era habitado por
um casal de italianos e tinha uma sala, um quarto e cozinha e o
pavimento de cima era habitado por um casal de franceses com uma filha
de 10 ou 11 anos. Tinha 3 quartos e uma área de circulação. A família
que ocupava a parte térrea era de camponeses e devia ser os donos da
propriedade. Eram designados por “babo” e “mama”. Não ficamos sabendo se
tinham filhos. Quanto à família do andar de cima, parecia ser gente de
fino trato. Não ficamos sabendo o porquê de estarem ali.
Com a nossa chegada à família passou a utilizar um único quarto, os outros dois foram ocupados por nós.
Nessa posição chegamos a passar fome. A
comida chegava pela manhã, antes do sol raiar, e à tarde quando
escurecia. A estrada que dava acesso à nossa posição era vista pelos
observatórios inimigos situados em cristas dominantes, razão pela qual
era intransitável durante o dia. Nessa posição só saíamos do abrigo
quando tínhamos missão de tiro, pois deveríamos ter o cuidado para não
denunciarmos a posição. Felizmente o francês não deixava faltar lenha
para a lareira.
Um dia a “bóia” não chegou à noite e
também não chegou na manhã do dia seguinte. Eram mais de 12 horas e a
nossa fome era de matar… Deitados em nossas camas, procurávamos
afugentar aquela fome que nos atormentava. Não tínhamos, realmente, nada
para comer porque “catoletas” que nos haviam dado como rações de
reserva eram demasiadamente enjoativas e, por isso, demos para os
habitantes da casa. O jeito era esperar que anoitecesse e então…
Foi nesse momento que a francesinha
entrou em nosso quarto com dois pratos de macarrão, um par mim e outro
para meu companheiro de quarto. Creio que foi o mais gostoso prato de
macarrão que comi em toda a minha vida.
Com a família italiana que morava no
andar térreo, tivemos menor contato porque como disse, durante o dia
raramente saímos de nossos abrigos, não só para não denunciar a posição
como também devido ao frio que era muito intenso.
Certa vez desci ao pavimento térreo, o
italiano chamou-me em particular e me ofereceu “uma binquera de vino”
mas pediu-me que guardasse segredo porque ele tinha pouco vinho e não
poderia oferecer a todos.
Saboreamos o gostoso vinho, e quando saí
para substituir o meu companheiro no observatório e na escuta do
telefone, o italiano, novamente, pediu-me que não falasse com ninguém
sobre o convite, pois ele tinha poucas garrafas para passar o inverno.
O vinho, naquela região, é uma bebida
muito apreciada e muito útil porque ativa a circulação do sangue,
promovendo uma sensação de aquecimento.
Logo que cheguei para substituir o meu
companheiro, comentei o fato e ele disse-me que já havia sido convidado e
que ouviu do italiano a mesma “parola”.
Muitos
outros acontecimentos poderia contar. Escolhi justamente estes porque
me agrada falar sobre a cordialidade e o espírito de solidariedade
daqueles camponeses italianos.
Nem a guerra, com toda a sua
brutalidade, conseguiu destruir ou modificar o espírito cordial e até
mesmo exagerado daquela gente boa e simples.
*FONTE: Do livro “Histórias de Pracinhas” Contadas por eles mesmos Autor: Vet Maj Álvaro Duboc Filho
*Site: http://www.anvfeb.com.br
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QUE PERFEITA HISTÓRIA, MEU TIO TAMBÉM SERVIU A 2° GUERRA MUNDIAL
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